Uma das características que demonstram emaranhamento
sistêmico dentro de uma família é a confusão de papéis entre vários membros. Um
pai não está no seu lugar – como pai ou marido, por exemplo. Ou uma mãe não
está no lugar da esposa e mãe. Os filhos também não estão no papel de filhos, e
muitas vezes interferem na vida dos pais. Da mesma forma, os pais querem
interferir na vida dos filhos adultos. Irmãos querem mandar em irmãos. Você já
viu situações como esta, não é mesmo? Tudo isso está fora da ordem.
Antes de falar sobre a ordem na família, vou explicar o que
é emaranhamento: emaranhamento quer dizer que as pessoas não se encontram numa
ordem adequada, onde o amor pode fluir por todos os membros familiares. As
pessoas estão identificadas com situações do passado ou até com vivências de
ancestrais, e por isso, não conseguem viver uma vida livre e plena, aqui e
agora. Essa identificação com o passado impede de viver plenamente o aqui e
agora, com toda energia vital. As emoções ficam distorcidas, um sujeito
sente-se extremamente cobrado numa situação, sem ter tantas razões para isso,
enquanto que outro se sente culpado, sem saber o porquê. E então, estas emoções
distorcidas são jogadas para dentro do relacionamento familiar, com cobranças
mútuas, acusações, sentimentos de culpa, gente se fazendo de vítima, outros
chantageando, outros ainda agredindo… lembra até a comédia italiana Parente
Serpente, de Monicelli…
Eu acho engraçado porque minha família não foge à regra…
Bem, mas vamos ao que interessa: como se posicionar diante de tudo isso? Como
trabalho com constelação familiar sistêmica, vou expor a visão de Bert
Hellinger. Tenho visto muitas pessoas se libertando deste círculo vicioso de
jogos, culpa e acusação, somente aplicando no dia-a-dia uma das regras que
Hellinger chama de hierarquia. Lógico que não é tão simples, pois se estamos
envolvidos em embrulhos familiares, estamos atolados até o pescoço destas emoções
distorcidas, e temos nossa parcela de responsabilidade. Na verdade, temos toda
a responsabilidade pela nossa felicidade! Nada é culpa dos parentes, sejam eles
pais, irmãos ou antepassados.
Por isso, diria que a primeira parte da sua libertação é
assumir a total responsabilidade pela própria felicidade. Assim, vamos falar
das ordens. A primeira é: um pai ou mãe vieram primeiro. Eles deram a vida. Só
este fato já é o suficiente para que o filho tenha profunda reverência por
eles. E gratidão. Mesmo que eles não tenham suprido o filho com as necessidades
de carinho, afeto e até mesmo materiais. Mesmo que tenham abandonado,
maltratado, desprezado. Eles vieram primeiro. Sem eles, não teria a vida. E
lógico, sem a vida, não teria o filho. Um filho que guarda mágoas ou até raiva
dos pais está automaticamente desperdiçando energia que seria direcionada para
a própria vida e para a criação dos próprios filhos – e sofrerá…
Parece duro, e sei que muitos pais deram razões para que
seus filhos tivessem raiva e até ódio deles, mas este é o nosso quinhão de
aprendizado espiritual desta vida. E quando percebemos que o que eles fizeram
foi por absoluta impossibilidade e incapacidade de fazer melhor, e olhamos para
os pais dos pais, começamos a acolher nossa vida e nossa infância como ela foi.
Isso é libertador! Profundamente!
Por outro lado, os pais não devem mais interferir na vida
dos filhos, a partir da idade em que eles estão prontos para a vida… e isso
ocorre por volta dos 20 anos ou um pouco mais. Não digo que não deve haver
relacionamento entre pais e filhos… o que eu digo é que, a partir daí, o filho
deve se virar sozinho: os pais já deram o que era necessário para que eles
crescessem. A felicidade ou infelicidade do filho não depende dos pais. Se eles
se pegam nisso, é porque cobram os próprios pais de terem dado pouco, e
transferem este sentimento de vitima aos próprios filhos… Depois falam que isso
é amor. Pode?
E entre irmãos. O que Hellinger diz? Irmãos são iguais entre
si. Ninguém tem que cobrar ninguém. Por uma questão temporal, o irmão mais
velho tem um pouco mais de autoridade. Porém, entre adultos, isso é
praticamente irrelevante. Não deve haver interferência entre irmãos. Não há
esta necessidade, e se isso ocorre, mostra um emaranhamento sistêmico, onde irmãos
se colocam no lugar de pai e mãe… Isso está totalmente fora da ordem.
Veja: estas regras são absolutamente simples, e se você
analisar com cuidado, verá que são lógicas. Mas é importante dizer: elas são
utilizadas principalmente onde existem questões emocionais, terapêuticas
envolvidas. Pessoas estão sofrendo. Estão umas sobre as outras. Quando a
relação é saudável, e lógico, respeitando as tradições culturais de povos onde
as famílias são muito unidas, estas regras não são importantes. Mas quando existe
esta confusão familiar, se aplicadas, principalmente após o trabalho com a
constelação familiar sistêmica, elas produzem um resultado fabuloso de
libertação para aquela pessoa que decide buscar sua liberdade, expandir sua
vida e poder se dar mais ao próximo, às pessoas que realmente podem receber
dela, ao invés de perder tempo e vida em relacionamento familiar distorcido.
Somente assim, o verdadeiro amor pelos pais e pela família pode se manifestar.
Sem culpa, sem cobrança, sem apego… e livre. E você? Como está a sua relação
com a família?
Constelação sistêmica com Alex Possato e Aguinailda Rosa