A compreensão de nosso destino e o assentimento a ele estão
no cerne do trabalho das constelações. Chamamos de destino as forças que,
vindas do passado, nos ligam inelutavelmente ao efeito bom ou funesto de certos
eventos. O efeito dos acontecimentos nos é imposto, quer o queiramos ou não, e
não temos a possibilidade de interferir nele.
A força do destino se revela, em relação a acontecimentos
traumáticos numa família, de uma forma às vezes inquietante. Nas constelações
experimentamos constantemente, e de modo impressionante, que somos muito pouco
livres e reeditamos em própria vida, sem o saber nem querer, destinos passados
e acontecimentos dolorosos, numa espécie de compulsão repetitiva. O efeito
maior das constelações consiste em nos fazer perceber como, sem necessidades
próprias, revivemos necessidades passadas e não aquietadas de outras pessoas, como
se o que passou tivesse de ficar em paz e se tornar definitivamente passado.
Este é o pão habitual do trabalho com constelações.
A concordância com a ligação ao destino significa por acaso
fatalismo? De maneira nenhuma. Pelo contrário. É verdade que a configuração de
nossa vida pelos destinos anteriores não pode ser anulada, mas para o futuro
nos tornamos mais livres através do que se mostra nas constelações. Então o
destino alheio poderá ser de algum modo exteriorizado, tornando-se uma
interface à qual já não estamos cegamente entregues. Pois a alma não liga
indissoluvelmente a destinos, ela nos libera deles através de um insight, de um
movimento próprio inconsciente ou, às vezes, de um modo totalmente casual (com
ou sem constelação).
Numa época em que às vezes julgamos que nossa vida esta
completamente em nossas mãos - uma ilusão de muitos individualistas -, o
reconhecimento do destino e o assentimento à ligação com o destino próprio e
alheio constitui um desafio. Tanto nos acostumamos à idéia de uma livre razão e
de uma autonomia individual que nos recusamos a reconhecer o que em épocas
passadas foi descrito como daimonía e eudaimonía - a triste sina e a felicidade
presenteada. O trabalho das constelações é seguramente uma afronta a uma
psicoterapia que valoriza acima de tudo a autonomia e a emancipação individual
e considera a humildade como uma submissão. Porém basta ler jornais e romances
para perceber como atua o destino e como o nosso poder e a nossa impotência
partilham a realidade.
Muitas pessoas sentem, instintivamente, como um processo
benéfico a reverência diante do destino ou diante de pessoas a que somos
ligados pelo destino. Uma reverência autêntica é quase sempre experimentada por
nós como solução e liberação. Quem precisa se curvar não é a criança pequena,
mas o adulto. E a reverência abarca vários processos: o ato de curvar-se, o
deixar que algo morra, e o ato de erguer-se. Bem longe de ser um processo
humilhante, a reverência exige coragem. Ela proporciona força, alívio da
respiração e abertura de espaço.
O destino, como força que inelutavelmente dispõe, não faz
caso de nossa vontade: ele a toma de roldão, sem esperar o nosso consentimento.
O destino não é uma pessoa, embora freqüentemente seja representado por uma
pessoa nas constelações. É um acontecimento direcionado a partir do passado, um
movimento que nos liga, através da alma, à realidade maior. Quantas vezes os
clientes falam de sua luta para não se tornarem iguais a seu pai ou a sua mãe,
e quantas vezes acrescentam que essa luta resultou em fracasso! Quantos
clientes quiseram fazer melhor que seus pais, e quantos confessam que não o
conseguiram! Um dos paradoxos da vida humana é que a luta contra o destino nos
liga ainda mais a ele, e o assentimento ao destino nos torna mais livres. É
como um redemoinho num rio. Quem luta contra a sua sucção é puxado ainda mais
para o interior, e quem sem pânico se entrega à sua força é muitas vezes
impelido para fora.
Reconhecimento do destino não significa entregar-se à doença
sem vontade e com resignação. Significa acompanhá-la com as forças do corpo e
da alma. Então, como num redemoinho, elas são de novo liberadas da atração da
doença ou da morte. Aqui muitas vezes faz sentido perguntar: O que há na doença
que quer curar? Naturalmente, o doente precisa de apoio externo. E muitas
constelações ajudam pessoas enfermas a se confiarem aos serviços médicos. Mas
as constelações também as fazem confrontar-se com a morte. Uma senhora,
gravemente doente, procurava saber através de uma constelação as causas de sua
doença. O representante da morte, colocado diante dela, olhou-a com carinho,
colocou-se ao lado dela e abraçou-a pelo ombro. Ela se defendeu com lágrimas,
mas o representante da morte não cedeu. Dois anos depois, essa senhora escreveu
ao terapeuta: "Eu me defendi muito contra a morte, e finalmente a aceitei.
Agora ela está a meu lado já há algum tempo, e estou viva". Mas também
existe o movimento oposto. Outra mulher em estado grave, que se sentia
fortemente atraída a seguir na morte seu pai, enredado em grave culpa, pediu ao
terapeuta que se esforçava por desprendê-la da morte: "For favor, deixe-me
ir para meu pai!" Ela se deitou junto do representante do pai, estreitou-o
nos braços, sorriu para ele com amor entre lágrimas, até que se acalmou completamente.
Na continuação do grupo ela atuou com alegria e energia e colocou muitas
questões práticas sobre seu comportamento em relação ao marido e aos filhos.
Notou-se que ela se preparava para sua morte. Que vontade terapêutica teria
aqui a força e o direito de se opor à sua morte?
(Jakob Schneider)